Por: Yane Diniz
Soltei meus cabelos e os agudos do coração. Acredite, não foi fácil, mirei nela.
Mamãe coragem faz questão de lembrar que quando criança, com a juba solta, eu rodava portando microfone imaginário e cantando: meu nome é Gal.
Ainda por hoje ela questiona: de onde vem essa liberdade, menina? Onde você aprendeu isso? Não te ensinei a ser assim.
Quando tento responder, olho bem denso e lá está ela, a criança interior. Se prestar atenção e com ouvidos atentos e fortes, escutará de fundo uma trilha sonora de vida: antes de você ser eu sou, eu sou, eu sou amor da cabeça aos pés.
Mamãe, mamãe não chore. Eu quero, eu posso, eu quis, eu fiz.
Mamãe, seja feliz.
Nascendo e se criando ao som de Gal não se cresce diferente. Vaca profana com seus cornos, pra fora e acima da manada, domando e chocando o gado enfurecido desses tempos e de qualquer passado escuro em que nos mantivemos sem tempo de temer a morte, musicando nossos dias. O resto que Caetane-se no conflito de autoria, é sua voz que escuto.
Mamãe mamãe, não chore.
A vida é assim mesmo, ela foi embora.
Você deveria ter ficado um pouco mais, Honey Baby. Oh sim, tão cansada, mas nem pra dizer que estava indo? Ainda me resta aquele beijo preso na garganta e o jeito de quem não se espanta, apenas lamenta e chora tua partida tão repentina. Logo agora, que tanto faz o quente, tanto faz o frio, a gente tá contente.
Hoje estamos órfãos do teu leite bom derramado em nossa cara, dona das divinas tetas. Mas ainda seguiremos acreditando que tudo é divino maravilhoso, mesmo no perigo da partida de vocês, que tocaram – e seguem tocando – nossos momentos com essa força estranha que a palavra tem de nos manter vivos. Que a memória permaneça sempre aqui, no anticomputador sentimental.
É dessa música ambiente nos ditos cotidianos, ecoando bem discreta e formando opiniões desde a infância, ou no conforto das salas de teatro – ao lado de granfinos de verdades morais questionáveis – ou ainda, da intensidade gritante necessária aos festivais, fazendo sentir o pulso da vida. É a tua voz, Gracinha, que fará falta no tempo feliz que acreditamos estar por vir.
Mas mamãe, mamãe, não chore.
Sigamos com nossos corações fora do peito, cabelos soltos e barato total.